Síntese inicial
Apresentamos, para conhecimento
amplo da sociedade, a denúncia formalizada aos órgãos de controle, notadamente
ao Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia (TCM/BA), com pedido de
remessa ao Ministério Público Estadual, sobre a reiteração dolosa de acumulação
ilícita de vínculos pelo médico Zenon Nunes da Silva Filho no exercício de
2025. Embora o objeto envolva municípios diversos de Santaluz, registra-se que
o denunciado é ex-prefeito de Santaluz, fato de alta relevância pública, tendo
já sido alcançado por decisão anterior desta Corte de Contas em caso similar de
tripla jornada. Agora, segundo os dados apresentados, ele volta a incidir na
prática, com manutenção simultânea de três vínculos remunerados em Cícero
Dantas, Fátima e Valente, sem compatibilidade de horários, em afronta direta ao
artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal e em descumprimento expresso do
Acórdão TCM/BA nº 03912e22APR.
Fundamentação-Fonte:
https://cnes.datasus.gov.br/pages/profissionais/consulta.jsp
https://www.tcm.ba.gov.br/controle-social/pessoal-por-cpf/
https://e.tcm.ba.gov.br/epp/ConsultaPublica/listView.seam
O precedente do TCM/BA e a
reiteração em 2025
O TCM/BA, no Processo nº
03912e22, de nossa autoria, julgou parcialmente procedente denúncia anterior
envolvendo o mesmo servidor, reconhecendo a ilegalidade da tripla acumulação
(Valente, Conceição do Coité e Santo Amaro) e aplicando penalidade de
advertência, com determinação de melhoria dos controles internos para impedir
novas contratações irregulares. O voto, relatado pelo Cons. Plínio Carneiro
Filho, destacou que a acumulação de três vínculos rompe o limite
constitucional, que admite, no máximo, dois vínculos, e apenas quando houver
real compatibilidade de horários. A decisão advertiu expressamente as gestões a
prevenir reiterações, sob pena de sanções mais gravosas.
Embora o Conselheiro tenha
registrado compreender tratar-se do início da gestão da prefeita à época, isso
está a anos-luz de significar uma licença poética do tipo “no começo vale
tudo”. Veja, no link abaixo, o exato momento da citação:
Em 2025, porém, a irregularidade
ressurge, agora envolvendo Cícero Dantas, Fátima e Valente, reiterando-se a
tríplice vinculação remunerada, o que evidencia ineficácia ou leniência dos
controles internos municipais e desrespeito ao comando da Corte. A situação
deixou de ser episódica para ganhar contornos sistêmicos, exigindo resposta
sancionatória proporcional.
Provas funcionais e
remuneratórias anexadas
Os registros funcionais e de
pagamentos de maio e junho de 2025 demonstram a coexistência de três vínculos
municipais remunerados, todos como médico, em localidades distintas.
- Em Cícero Dantas, é indicada uma carga
horária de 40 horas semanais, com pagamentos líquidos de R$ 6.924,33
(maio/2025) e R$ 3.500,89 (junho/2025).
- Em Fátima, é indicada uma carga horária
de 20 horas semanais, com pagamentos líquidos de R$ 8.048,81 em ambos os
meses, tendo como base salarial informada o valor de R$ 10.800,00.
- Em Valente, é indicada uma carga
horária de 20 horas semanais, com pagamentos líquidos de R$ 3.000,46 em
ambos os meses, com vínculo admitido em 01/07/2017.
A planilha remuneratória e as
folhas, juntadas aos autos, consolidam a materialidade. Não há compatibilidade
real que legitime o cumprimento simultâneo de 40h + 20h + 20h em três
municípios distintos, considerados trajetos, deslocamentos e a exigência
presencial do atendimento assistencial.
CNES/DATASUS: múltiplos
vínculos simultâneos e inviabilidade prática
A consolidação dos dados do
CNES/DATASUS, de janeiro a setembro de 2025, evidencia a manutenção de vínculos
simultâneos do médico em diversos municípios baianos, combinando vínculos
empregatícios temporários, prestação como pessoa física, como pessoa jurídica e
via cooperativas. Entre os estabelecimentos listados nos autos, constam, entre
outros: Cícero Dantas (CNES 7433980), Fátima (CNES 0796123), Valente (CNES
0710210), Catu, Alagoinhas, Conceição do Coité, Inhambupe, Nova Soure,
Olindina, Santa Bárbara, Retirolândia, Santaluz (CNES 0793647) e Santo Amaro.
Em cada mês analisado, coexistem ao menos três vínculos públicos municipais
remunerados em cidades distintas e, em diversos meses, número sensivelmente
superior. Ainda que as cargas ambulatoriais apareçam fatiadas em blocos de 2,
4, 8, 10 ou 20 horas, a dispersão geográfica e a exigência de presença tornam
inviável a compatibilidade prática de horários. O desenho fático, repetido mês
a mês, reafirma a reiteração da mesma conduta já enfrentada pelo TCM/BA no
Acórdão nº 03912e22APR.
Enquadramento jurídico e
responsabilidade dos gestores
A Constituição Federal, no artigo
37, inciso XVI, veda a acumulação remunerada de cargos, permitindo, apenas
quando houver compatibilidade de horários, as hipóteses taxativas de dois
cargos de professor, um cargo de professor com outro técnico ou científico, e
dois cargos privativos de profissionais de saúde. Mesmo ao abrigo da exceção
dos profissionais de saúde, o limite máximo é de dois vínculos. A tripla
acumulação é ilegítima por si só, independentemente de alegações de “prestação
efetiva”. A jurisprudência administrativa do TCM/BA afasta a convalidação da
irregularidade e responsabiliza os gestores por falha de controle, impondo o
dever de verificação prévia, no ato de contratação e durante a vigência, sobre
vínculos ativos, compatibilidade de horários e limites constitucionais. Diante
da reiteração após advertência formal, impõe-se a adoção de sanções mais
gravosas do que a mera advertência, a cessação imediata de vínculos irregulares
e a glosa de despesas quando caracterizada ausência de contraprestação,
observadas as salvaguardas de boa-fé e caráter alimentar quando cabíveis.
Omissão de transparência em
Valente e possível improbidade contratual
A denúncia evidencia também falha
grave no Portal da Transparência de Valente, com erro técnico recorrente
(java.io.FileNotFoundException) que impede a consulta à remuneração de
servidores, em violação à Lei de Acesso à Informação. Identifica-se que o sistema
é mantido pela empresa Sudoeste Informática, contratada pelo Contrato
Administrativo nº 116/2025 (valor global de R$ 270.000,00), cujo objeto inclui
manutenção e disponibilidade do sistema. A persistência da falha indica
inadimplemento contratual e possível pagamento sem contraprestação, hipótese
que se subsume ao Art. 10, VIII, da Lei nº 8.429/1992 (improbidade
administrativa por prejuízo ao erário). Há recomendação de apuração, com
análise de empenhos, liquidações, ordens de pagamento e eventuais penalidades
contratuais, além de exigência de restabelecimento imediato da transparência
ativa.
Medidas requeridas aos órgãos
competentes
A peça requer o recebimento da
denúncia pelo TCM/BA, com a imediata instauração de processo de fiscalização,
notificação dos gestores de Cícero Dantas, Fátima e Valente, e do servidor,
para apresentação de defesa e juntada integral de folhas, contratos, escalas e
frequência de 2025. Requer o cruzamento com bases do e-TCM e extração direta
dos registros CNES/DATASUS referentes ao CPF do profissional e aos CNES dos
estabelecimentos indicados. Recomenda-se requisitar aos municípios envolvidos
cópias integrais de contratos, credenciamentos, agendas, listas de atendimento,
registros de ponto, produção ambulatorial, SIA/SUS, prontuários assinados e
relatórios de auditoria. Pede-se, no mérito, a declaração de ilegalidade da
tripla acumulação, a aplicação de sanções proporcionais (inclusive multa, nos
termos da LC nº 06/1991), a cessação imediata dos vínculos irregulares e a
imposição de controles prévios e permanentes de acúmulo de vínculos. Havendo
indícios, requer-se a remessa ao Ministério Público de Contas e ao Ministério
Público Estadual para as providências pertinentes, inclusive responsabilização
por violação aos princípios da administração e por eventuais fraudes
documentais, simulações de frequência ou pagamentos sem prestação.
Notificação pública e
interesse social
Esta publicação cumpre finalidade
informativa e de controle social, para que toda a sociedade tenha ciência da
denúncia apresentada, seu lastro probatório e os pedidos endereçados aos órgãos
de controle. É dever cívico zelar pela legalidade, moralidade e eficiência na
gestão dos recursos de saúde. A reiteração de tripla jornada depois de
advertência formal, somada à falha de transparência em Valente, exige resposta
institucional firme, sob pena de naturalizar práticas incompatíveis com a
Constituição.
Referências anexas citadas na
denúncia
Acórdão TCM/BA nº 03912e22APR
(Processo TCM nº 03912e22). Planilha remuneratória de 2025. Extratos
CNES/DATASUS por CPF e estabelecimentos. Documentos de folhas de pagamento de
Cícero Dantas e Fátima (maio e junho/2025). Registros de Valente. Vídeo demonstrativo
de erro no Portal da Transparência de Valente e documentação do Contrato
Administrativo nº 116/2025 com a Sudoeste Informática. Outros documentos
correlatos constantes na relação anexa.
Nota final ao leitor
Os fatos e documentos agora tornados públicos reiteram questão já enfrentada pelo TCM/BA, com solução clara desde 2023. Cabe aguardar a pronta atuação dos órgãos competentes, com a seriedade e celeridade que a matéria exige. E, convenhamos, ousadia não faltou: depois de ser advertido, tentar “zerar o cronômetro” e voltar à tripla jornada em 2025 é quase pedir para levar uma nova chamada do TCM/BA — agora, espera-se, com tom menos diplomático.