Temos,
assim, de ressaltar que não encontramos uma resposta pronta e acabada para a
indagação feita no início do capítulo, sobre se haveria uma ética que mais se
adequaria ao exercício da atividade política. Mesmo cientes da complexidade das
relações entre a ética e a política, não vislumbramos, tal como teorizado por
Maquiavel, como a imagem da política pode estar dissociada da ética, pois esta
tem que penetrar nos desdobramentos da política, dada a premente necessidade de
sua estruturação ética. Noutros termos, mesmo detentor de uma lógica própria, o
poder político não pode se desvencilhar da ética.
Em se dissociando da ética, a
política perde sua capacidade intrínseca de realização do bem da coletividade dentro
dos padrões de moralidade exigidos. Diante dos ensinamentos de Kant, que
priorizam um agir moral intrínseco e válido para todos (imperativo categórico),
e de Max Weber, que levam em consideração que na ética política devem ser
ponderados os resultados das ações, de uma coisa temos certeza: a ética da
conduta política não pode ser semelhante à ética de qualquer outra conduta.
No
nosso sentir, mesmo diante do fato de a política ser uma ciência autônoma e
detentora de uma lógica própria, a ligação entre a ética e a política não se
pode romper, sob pena de se instalar um campo bastante fértil para a
inobservância de princípios básicos do Estado Democrático de Direito, com
destaque para o princípio da moralidade.
Quanto à relação entre o direito, a
política e a ética, muito embora reconheçamos a autonomia das questões
jurídicas no campo do direito, das questões políticas no campo da política e
das questões éticas no campo da ética, entendemos que essa autonomia não
implica a dissociação entre o direito e a ética, tampouco entre o direito e a
política.
Nesse contexto, os normativos jurídicos devem fazer uma interface
entre política e ética, harmonizando-as, permitindo aos julgadores punir de
forma austera, aqueles que ameaçam a moralidade e não abrindo espaços para a
impunidade, que funciona como um incentivo para a prática de atos corruptos das
mais diversas espécies. Realisticamente, o que vemos é que a construção eficaz
do tão falado Estado Social Democrático de Direito, no qual o princípio da
moralidade deveria se realizar amplamente, fica cada vez mais prejudicada, pois
os desvirtuamentos ocorrem sem que haja a efetivação prática das medidas
punitivas cabíveis para os políticos corruptos. Assim, considerando que a
democracia pressupõe a participação de todos, não apenas no processo de
escolha dos governantes, mas nos fatos sociais que afetam a coletividade
administrada; considerando que sempre devemos nos perguntar quais são os
principais desafios éticos com os quais nos defrontamos no combate e prevenção
da corrupção; considerando que os escândalos sobre corrupção produzem um
profundo mal-estar no seio da nossa sociedade, o que faz com que reapareçam
antigas preocupações éticas; considerando que o exercício da política deve ser
compatível com a ética; considerando que não há uma ética ideal ao exercício da
atividade política; surge nova indagação: não seria a associação das éticas da
convicção (Kant), da responsabilidade (Weber) e do discurso (Habermas) um
caminho a seguir para o alcance de soluções normativas mais efetivas?
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